quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Depressão? Não! Paixão.


Imagine a cena: uma senhora de setenta e poucos anos é encaminhada ao psicólogo com o provável diagnóstico de depressão. A senhora chega com seu vestidinho de chita, cabelo preso num coque bem alinhado e com um brilho no olhar que faz a psicóloga duvidar que era aquela mulher a paciente que deveria ser atendida naquele horário. Suas bochechas rosadas e sua presença leve não parecia em nada com as de alguém com depressão.

A psicóloga entra para o consultório e começa a conversar com a senhora.  Primeiro vem uma lista interminável de sintomas: insônia, falta de apetite, ansiedade, tremor, palpitação no peito, falta de concentração, etc. Aparentemente tudo se enquadra. Conversando um pouco mais a senhora conta sobre sua vida, seu marido falecido há muitos anos, seus filhos e netos, e, por fim, ela fala sobre um amigo da família que vai toda tarde visitá-la. Neste momento um doce sorriso estampa-se em seu rosto. Ela não consegue esconder a empolgação. A psicóloga compreende o que está acontecendo. Conversa com ela e explica que não se trata de depressão, mas algo bem diferente. Qual é o mal que acomete essa pobre senhora sexagenária? Paixão! Mais pura e simples paixão. A senhora ouve surpresa e atenta cada palavra da psicóloga e com um sorriso entre os dentes pergunta “Mas doutora, como pode? Eu já sou velha.”

Felizmente essa história aconteceu de verdade. Sim... uma avó estava apaixonada ao ponto de deixar o bolo queimar no forno. É surpreendentemente agradável perceber que por mais velha que a pessoa possa ser  o coração continua batendo. A idade é incapaz de desensibilizar nossas emoções. Quando alguém pensa que já viu tudo, já viveu tudo, que já esgotou sua cota de amor durante a vida vem alguém e arrebata-lhe coração.

Qual foi o final da história? Ela num desespero adolescente perguntou “mas o que eu faço agora? Já somos muito velhos, não estamos mais na idade de namorar.” A psicóloga lhe sorri conspiradoramente e diz “Não faça nada, mas não se esqueça de passar perfume na hora que ele vier lhe visitar!”.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

O divórcio é um fracasso?


Não é raro encontrar pessoas que se sentem fracassadas, pois seus casamentos chegaram ao fim. O discurso parece sempre o mesmo “Eu não consegui. Casamento pra mim é um só. Meus avós ficaram casados mais de cinquenta anos. Antigamente os casamentos duravam mais. Não sei o que está acontecendo.”.
É interessante que nessa perspectiva o passado toma um colorido diferente. Os casamentos dos nossos antepassados parecem mais estáveis, duradouros e felizes. Contudo, é necessário observer que o matrimônio dos nossos avós era embasado em valores diferentes dos casamentos atuais.
Antigamente uma noiva era escolhida pela família do noivo devido a sua posição social, família a qual pertencia, dotes, educação, posses e perspectiva de dar muitos filhos ao futuro esposo. Por sua vez, o pai da moça aceitava o matrimônio se o rapaz provasse ser oriundo de uma boa família, se tivesse boa reputação, se fosse trabalhador e apresentasse um bom status social.
O enlace era acertado entre os pais dos noivos. A relação assemelhava-se a um contrato social onde os papéis eram bem definidos. Não havia muito espaço para sentimentalidades. A mulher deveria ficar feliz se o homem fosse educado e não batesse nela. E, em alguns casos, a sorte fazia com que o acordo político/econômico estabelecido pelas famílias coincidisse com os sentimentos dos nubentes.
Com o mito do amor romântico, o casamento deixou de ser um acordo entre famílias para se tornar um ato de amor. O matrimônio tornou-se o ápice do romance vivido entre o casal. Casamento por conveniência passou a ser visto como algo mesquinho e vil. Hoje não importa mais qual família o rapaz pertence, mas o frio na barriga que ele faz a moça sentir ao seu lado. O homem não liga mais se a moça é prendada, se sabe cozinhar e costurar, para ele o que importa é a esperança de viver momentos felizes ao lado dela.
Antes o casamento era sinônimo de estabilidade e garantia de reprodução, portanto, ser infeliz não era justificativa para um divórcio. Contudo, hoje, tornou-se sinônimo de amor e felicidade, sendo assim, como manter essa relação quando os dois acabam?
Um dos maiores desafios dos casais modernos é conseguir medir até quando insistir na relação ou se já é o momento de finalizá-la. É consideravelmente dramático perceber que acabou. Constatar que “viver felizes para sempre” é pra poucos, ou pelo menos, que não foi dessa vez que aconteceu o final feliz.


Acertar a medida de até onde vai o amor e onde começa a falta de respeito é muito complicado. Há casais que terminam quando surge a primeira crise forte. Nem tentam acertar a relação. Por outro lado não são poucos os que permanecem infelizes durante anos na esperança de que as coisas melhorarão.
Ambos os casos são problemáticos, pois, no primeiro, geralmente essas pessoas não conseguem se envolver inteiramente em outra relação. Mesmo que consigam, a sombra do casamento desfeito acompanha essas pessoas. Já no segundo caso a pessoa pode ser invadida por um sentimento de comodismo, onde a infelicidade parece-lhe uma coisa normal. Ser infeliz, fazer o outro infeliz não incomoda mais. No fundo não há diferença.
Há ainda a possibilidade do casal levar a relação ao limite insustentável. Tudo transforma-se em falta de respeito, mágoa e dor.
Diante das possibilidades apresentadas acima, o divórcio pode se tornar a saída mais digna e madura para um casal. Aceitar o fim e guardar o que houve de bom na relação, permanecendo o respeito, o carinho e a consideração pelo tempo vivido juntos é uma conquista. Às vezes, colocar um ponto final não é fracasso, mas sinal de sabedoria.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Casamento: a gota d'água


Através da natureza podemos ver a força que pequenos eventos contínuos possuem. Um bom exemplo são as formações de estalactites e as estalagmites. Elas são formações que crescem dentro de grutas e cavernas causadas pela precipitação de carbonato de cálcio que é arrastado pela água que pinga. Todos os dias, incansavelmente a água vai gotejando e ao longo de séculos surgem as estalactites (formação do teto direcionada ao chão) e as estalagmites (formação do chão direcionado ao teto).
Se na natureza pequenos eventos como o gotejar da água são capazes de criar formações tão impressionantes como as estalactites, nos relacionamentos humanos não é diferente. Muito dificilmente um casamento chega ao fim de uma hora para a outra. Pequenas gotas vão minando a relação. Um dia ele se esquece a data de casamento, no outro ela se esquece de dar um beijo de despedida, na semana seguinte ele se esquece de pedir por favor, no outro mês ela se esquece de pedir licença.
E assim vai, dia a dia, gota a gota. Quando se vê o casal não se toca mais, não conversa, não troca confidências. Ela não se preocupa mais com a lingerie que usa, ele não faz mais a barba para ficar com ela. Os dois não vão mais ao cinema. Sair pra jantar então? De forma alguma! Os filhos, o trabalho, as contas, os problemas, tudo é um empecilho para a convivência, tudo é mais importante. Conversa-se apenas o estritamente necessário. As contas do mês, os problemas na escola do filho, a necessidade de pintar a casa.
Os pequenos defeitos tornam-se insuportáveis. “Ele não acha nada sozinho!”, “Ela reclama de tudo!”. Sexo torna-se algo escasso. Não há tempo, não há intimidade, não há desejo. O que era amor começa a transformar-se em mágoa.  Sem ninguém perceber a estalagmite está surgindo.
Um dia ela se encanta pelo amigo que lhe escreve para desejar bom dia. Ele, por sua vez, sem  perceber comprou uma nova colônia para agradar a moça do elevador. Ela acorda ansiosa para olhar seu e-mail e ele conta os minutos para pegar o elevador. A crise já está instalada. Ambos têm dúvidas se são felizes com a relação.  Um dos dois envolve-se afetivamente com outra pessoa. O palpitar no peito torna-se uma paixão avassaladora. “Quando estou com ele sinto um frio na barriga, sabe... aquela coisa meio de adolescente.”, “Com ela eu sinto que estou vivo de novo. É tudo novo, eu me sinto homem novamente!”.
De repente um deles percebe o que está acontecendo. A pessoa quer salvar o casamento, mas a distância entre os dois é muito grande e toneladas de mágoas emperram o caminho. A tarefa de reatar a relação é muito árdua, a sensação é que não há como retornar o caminho já trilhado. Surgem as desconfianças até que um resolve terminar o casamento, pois está apaixonado por outra pessoa. Lágrimas e mais lágrimas lamentam a relação destruída. Cabe ao “infiel” a culpa pelo fim e, por um lado, é aliviante saber que é o outro quem é o culpado. “O casamento fracassou, mas não foi por culpa minha, ela que se apaixonou por outro”.
Não, não foi a paixão por outra pessoa que destruiu a relação, foram as gotas diárias de indiferença, falta de carinho, falta de tempo, grosseria, distanciamento e falta de investimento que minaram o casamento. A pergunta sempre é “ainda tem como salvar a relação?”. Sim, claro que sim. Mas há um preço a se pagar. É necessário abrir mão das mágoas acumuladas durante os anos e dedicar-se à arte da (re)conquista.