quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Luto



Na era da informação, onde tudo tem que funcionar do modo mais rápido e eficaz possível, parece que a vida tornou-se instantânea. Não há tempo a se perder. As pessoas estão sempre atrasadas, sempre correndo. Corre-se atrás da vida... corre-se da vida.

O tempo que já era escasso, quase não existe quando o assunto envolve desprazeres. Dor? Analgésico! Ansiedade? Ansiolítico! Tristeza? Antidepressivo! Há sempre uma resposta pronta que nos impulsiona para manter o movimento. Se a pessoa não está sorrindo o tempo todo existe algum problema, é necessário ir ao médico e tomar uma medicação.

Lembro-me de que há alguns anos atrás, quando eu trabalhava para num posto de saúde de uma prefeitura no interior de Minas, encaminharam-me um senhor que me disseram que estava deprimido. O senhor, já com mais de setenta anos, havia perdido a companheira com quem viveu durante mais de cinquenta anos. A falecida havia sido acometida por câncer e sofrera muito antes de morrer. O viúvo estava muito triste e amuado, havia emagrecido muito e era pego constantemente com lágrimas nos olhos.

Não esqueço o momento que o vi. Um senhor de pele castigada pelo sol, com um olhar singelo e um sorriso melancólico. Seu cabelo estava cortado, a barba feita, as roupas limpas e bem passadas. Cumprimentou-me um pouco tímido e pediu desculpas (desculpas pelo o que?). Disse-me que mandaram ele vir para a consulta com a doutora e por isso ele tava lá, mas que não tava sentindo nenhuma dor não. Só o pé, mas já estava melhorando.

Conversamos durante uma hora e meia. Ele contou-me sobre sua hortinha; sobre suas dificuldades na cozinha, motivo pelo qual havia emagrecido tanto; sobre seu machucado no pé, que o fazia ir ao posto de saúde trocar o curativo três vezes por semana e, é claro, sobre a vida e morte de sua esposa.

Quando ele foi embora reuni a equipe médica para conversar sobre o caso. Falei que aquela tristeza que o senhor sentia não era nem de longe depressão. Pelo contrário, ele estava caminhando muito bem para quem havia perdido a esposa há tão pouco tempo (menos de dois meses), ele estava se cuidando, ia ao posto, se alimentava (como podia, pois havia perdido a pessoa que providenciava sua comida), enfim, estava tentando continuar a vida. Concluí minha fala dizendo que se ele estivesse dando pulos de alegria eu recomendaria investigar melhor os motivos que levaram ao óbito sua esposa.

Ora... chorar a morte de uma pessoa amada não é apenas normal, é saudável. O luto é um processo importante para a saúde psíquica da pessoa. É necessário respeitar o luto daqueles que perdem, independentemente do que se perder. Um companheiro, um emprego, uma amizade, uma casa ou um sonho, a perda precisa ser vivida e trabalhada. É necessário compreender que esse é um processo natural e importante, respeitando quem está vivendo esse momento e dando o suporte necessário para que a pessoa consiga vivenciar e superar esse momento.

2 comentários:

  1. Adorei o texto....as vezes, as pessoas estão tão preocupadas em parecer bem, que esquecem do quão importante é viver cada momento, mesmo que seja de dor. A dor também é importante, ou talvez mais importante, para o crescimento...

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  2. Mas, o luto ou a tristeza do outro incomoda demais. É comum aos que estão próximos àquele que sofre desejarem ou mesmo exigirem que a pessoa fique bem logo.É mais confortável. Não se respeita mais o sofrimento legítimo do luto, tão inerente à vida.Cristiane

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